Psicogênese da língua escrita, de Emilia Ferreiro e Ana Teberosky
Aluno CLAUDEMIR ANDRADE QUEIROZ
Professora MARILENE
O livro de Emília Ferreiro e Ana Teberosky – fruto da
pesquisa obtida no decorrer de dois anos de trabalho experimental com crianças
entre quatro e seis anos – tem por objetivo explicar como se dá o processo
através do qual a escrita se constitui em objeto de conhecimento para a
criança, isto é, a escrita, como toda representação baseia-se em uma construção
mental que cria suas próprias regras. As investigações de Emília e seus
colaborados procuram demonstrar o papel ativo do sujeito no processo de elaboração individual da escrita. Na relação com a escrita,
a criança elabora e testa hipóteses de natureza cognitiva a respeito de como se
escrevem as palavras. A criança, mesmo muito pequena, tem a habilidade de se
colocar problemas, criar hipóteses, testá-las e construir verdadeiros sistemas
interpretativos na busca pela compreensão do universo ao seu redor.
Nas palavras das autoras, objetivou-se “[...] tentar uma
explicação dos processos e das formas mediante as quais a criança consegue
aprender a ler e escrever. Entendemos por processo o caminho que a criança
deverá percorrer para compreender as características, o valor e a função da
escrita, desde que esta se constitui no objeto da sua atenção, portanto, do seu
conhecimento” (p.18). As pesquisas de Emília Ferreiro impactaram de tal forma o
conceito de alfabetização que desmontou as teorias e possíveis explicações que
os brasileiros levaram décadas para explicar o fracasso na alfabetização
inicial. Foram os estudos da autora que permitiram diferenciar alfabetização de
ortografização. Hoje se sabe que os erros de ortográfica não estão relacionados
ao modo de falar e sim com a convivência ou não com textos impressos.
A teoria da psicogênese da língua escrita,
segundo Ferreiro e Teberosky, consiste em supor que é necessária uma série de
processos de reflexão sobre a linguagem para passar a uma escrita; mas, por sua
vez, a escrita constituída permite novos processos de reflexão que dificilmente
teriam podido existir sem ela. O processo psicogenético de construção da língua
escrita é caracterizado pelas inúmeras interações sociais e pelas experiências
do sujeito aprendiz na prática de ler e escrever.
Internamente, os conceitos são construídos em caráter provisório e
relativamente estáveis na evolução da aprendizagem, sendo assim um processo
ativo, dinâmico, auxiliado pela seqüência de contradições e conflitos
cognitivos.
A obra “Psicogênese da língua escrita” se estrutura em oito capítulos. No
primeiro, de maneira introdutória as autoras apontam para os princípios básicos
que guiaram a construção do projeto experimental em que o método clínico ou de exploração
crítica, desenvolvido por Piaget, constitui a base teórica de
referência. Entretanto, Ferreiro e Teberosky não tomam a teoria piagetiana como
“dogma”, antes partem dela para provar a validade geral e aplicá-la em domínios
ainda inexplorados a partir dessa perspectiva. Os estudos experimentais
envolveram crianças de diversos meios sociais em diferentes países (Argentina,
México, Espanha e Brasil).
O capítulo dois “Os aspectos formais do grafismo e sua
interpretação” aborda
as características formais que um texto deve possuir para permitir um ato de
leitura: i) quantidade suficiente de caracteres, ii) variedade de caracteres,
iii) relação entre números e letras e o reconhecimento de letras individuais e
iv) distinção entre letras e sinais de pontuação. Dado esses pressupostos, as
crianças definem letras e números, que lhes são apresentados, como objetos em
oposição ao desenho. A distinção de números/letras/sinais de pontuação ocorre
por conta dos conhecimentos socialmente transmitidos, sistematizados então pela
criança. Um dos critérios utilizados por Ferreiro era a seleção das palavras e
frases apresentadas às crianças, ou seja, o repertório de palavras não deveria
constar de manuais de alfabetização e apresentar uma relação semântica entre si
(fazer parte do mesmo campo lexical): alimentos, animais, brinquedos, entre
outros.
Os capítulos três e quatro abordam as hipóteses criadas
pelas crianças em relação à escrita. Nesse sentido a representação
icônica (imagem)
funciona como expressão de seu pensamento através de desenhos, não tendo a
noção de escrita no sentido propriamente dito. Escrever é a mesma coisa que
desenhar. Por outro lado, a representação não-icônica (sem imagem) vai além do desenho,
funcionando como expressão do pensamento da criança através de rabiscos, daí o
termo “não-icônica”. A criança inicia o conceito de escrita, mas ainda não
reconhece as letras do alfabeto e seu valor sonoro.
Para Ferreiro e Teberosky toda criança passa por níveis
estruturais da linguagem escrita até que se aproprie da complexidade do sistema
alfabético. São estes níveis estruturais, que embasam a teoria da psicogênese,
e que os capítulos cinco, seis e sete abordarão em profundidade. Os níveis de
escrita, segundo a Psicogênese da língua escrita são: Nível
1: pré-silábico (a
criança não estabelece vínculo entre fala e escrita e tem leitura global,
individual e instável do que escreve: só ela sabe o que quis escrever), Nível
2: Intermediário Silábico (a
criança começa a ter consciência de que existe alguma relação entre pronuncia e
a escrita),Nível 3: Hipótese
Silábica (a
criança tenta fonetizar a escrita e dar valor sonoro às letras), Nível
4: Hipótese Silábico-Alfabética ou Intermediário II (a criança consegue combinar
vogais e consoantes numa mesma palavra, numa tentativa de combinar sons, sem
tornar, ainda, sua escrita socializável) e Nível 5: Hipótese alfabética (a criança compreende o modo de
construção do código da escrita).
A relevância desta obra, após vinte anos de sua primeira
edição, não está somente na revolução teórica gerada pela discussão de seus
postulados, visto os documentos produzidos pelas secretarias de educação da
época, que recomendavam a utilização de tais pressupostos. O grande valor da “Psicogênese da língua escrita” foi permitir que os estudos de experimentação
pedagógica construíssem uma didática voltada para a linguagem, trazendo os
textos do mundo para dentro da escola e buscando aproximar as práticas de
ensino da língua das práticas de leitura e escritas reais, o que vem sendo
difundido em larga escala pelo Ministério da Educação (MEC) nos Parâmetros e
Referenciais Curriculares Nacionais (PCN’s) para a educação básica. Os
conceitos de Ferreiro e Teberosky apontam na direção de uma compreensão cada
vez maior dos processos de aprendizagem dos diferentes conteúdos, sem distorcer
o objeto a ser ensinado, adaptando-se ao percurso do aprendiz, ou seja, a
alfabetização inicial é de natureza conceitual e constitui-se em questão
crucial para se entender os rumos pedagógicos tomados pela educação básica brasileira
nos últimos anos.
Referências
Bibliográficas
FERREIRO,
Emília e TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da Língua Escrita.
Porto Alegre: ArtMed, 2008
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